Mesmo com a diminuição do número de inadimplentes brasileiros em setembro de 2020, empresas especializadas lançam mão de estratégias de cobrança que ferem a dignidade do consumidor, assim como as normas estabelecidas pelo Código de Defesa do Consumidor e a Constituição Federal. É o que chamamos de cobrança abusiva.
Segundo dados da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o percentual de famílias que relataram ter dívidas (cheque pré-datado, cartão de crédito, cheque especial, carnê de loja, crédito consignado, empréstimo pessoal, prestação de carro e de casa) alcançou 67,2% em setembro de 2020, a primeira queda desde maio deste ano.
O credor tem direito de exigir o cumprimento do contrato e o pagamento por parte do consumidor, especialmente no que se refere ao pagamento de valores devidos nas datas fixadas. Entretanto, isso não significa que a pessoa pode ser exposta ao ridículo, nem submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.
Cobrança legal x ilegal x abusiva
De acordo com o especialista em Direito Civil e Contratos, Leandro Nava, a cobrança só poderá ser feita entre credor e consumidor/devedor, respeitando os horários permitidos em lei, bem como não levando o devedor ao ridículo decorrente da cobrança.
Sim, há horários para que os credores possam entrar em contato com pessoas físicas ou jurídicas. Durante a semana é permitido de segunda a sexta das 8h às 20h. Nos sábados, contato para cobrança é permitido das 8h às 14h e, aos domingos, é proibido entrar em contato para cobrar dívidas.
“São consideradas cobranças ilegais aquelas em que grandes empresas exigem um valor que não pode ser cobrado. Esse tipo de infração à lei é mais comum do que se imagina e pode acontecer em qualquer tipo de contrato”, explica o advogado.
Por sua vez, Nava ressalta que cobranças abusivas ocorrem quando há diversas ligações ou envio de correspondências para a casa de parentes do devedor, bem como envio do nome do consumidor para bancos de proteção de créditos sem prévio aviso.
“Aquela dívida que está sendo cobrada ferindo o disposto do artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor, ou seja, que expõe o consumidor a constrangimento, ameaça, seja física ou moral, interferindo em seu trabalho, descanso ou lazer são consideradas abusivas”.
O que fazer?
O artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor diz: “O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável“.
Além disso, de acordo com o artigo 71, a pena pode chegar a até um ano de prisão, além do pagamento da multa.
O advogado Marcelo Godke, especialista em direito comercial, diz que a melhor forma de resolver práticas abusivas durante uma cobrança de dívida é procurar o Procon e registrar uma reclamação.
“O consumidor pode também entrar com uma ação civil para pedir danos morais. Como essa prática é crime, outra coisa que pode ser feita é processar criminalmente o credor, procurar o juizado especial para entrar com processo de indenização”, explicou.
Além disso, Nava afirmou que, após ação judicial favorável ao consumidor, a pessoa pode receber uma indenização por danos morais e materiais e, se for cobrado indevidamente, requerer a devolução em dobro daquele valor anteriormente que foi pago. “Lembrando que um direito não poderá sobrepor a outro direito”, enfatizou o especialista.
Como evitar cobranças abusivas?
Godke acredita que é difícil evitar essas cobranças, principalmente se o perfil do credor for agressivo. “O que pode ser feito, em casos de práticas reiteradas, é mandar um notificação e em seguida processar. O credor pode mandar notificação, entrar em contato, entrar com uma ação de cobrança. O que não pode é notificar aos quatro ventos que a pessoa deve”, ressaltou.
Nava aconselha o credor a ter um planejamento a ser seguido e cumprido na integra como dia e horário de cobrança, bem como número de contatos realizados, evitando assim pagamentos de indenizações por erro ou excesso na cobrança.
Não enviar correspondência a qualquer endereço do devedor com aviso externo (dando ciência a terceiros) de que existe um débito em aberto;
Não proceder com ligações fora do horário comercial, ou mesmo dentro do horário comercial de forma desproporcional;
Não deixar recados no trabalho ou com parentes;
Não utilizar de coação para obtenção do crédito.